Editorial

Taxação dos super-ricos, um avanço na luta contra a desigualdade

Tributação progressiva, aliada a políticas como a de valorização do salário mínimo, é caminho para buscar mais igualdade no Brasil.


POR Assis Melo

Publicado em 31 de outubro de 2023


O Brasil deu início à longa batalha para taxar seus super-ricos e, com isso, combater a desigualdade de renda. Na quarta-feira passada (25), por 323 votos a 119, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que altera a cobrança de impostos sobre os chamados “fundos de alta renda”: os fundos exclusivos (com ativos no Brasil) e os offshore (com ativos no exterior).

Quando falamos em super-ricos, não é força de expressão. Para entrar num fundo exclusivo – que só aceita cotista único, individual –, é preciso aplicar pelo menos R$ 10 milhões. Segundo o Ministério da Fazenda, apenas 2.500 brasileiros têm ativos nessa modalidade. Mas seus fundos exclusivos, somados, chegam a R$ 756,8 bilhões.

As offshores – que podem ter mais de um sócio – são empresas abertas por pessoas físicas no exterior para abrigar investimentos (bens e aplicações). Estima-se que o patrimônio total dessas empresas passe de R$ 1 trilhão.

Para os milionários, a vantagem desses fundos é justamente a tributação inexistente. Fundos exclusivos só podem ser taxados quando o cotista resgatar seus lucros – ou seja, sacar os rendimentos da aplicação. Se ele passar dez anos sem resgate, por exemplo, não pagará imposto de renda nenhum. Já os fundos offshores serão taxados apenas quando seus ativos voltarem ao Brasil, o que não tem prazo para ocorrer.

Essas distorções fazem parte da longa lista de injustiças existentes no sistema tributário brasileiro. É o mesmo sistema que avança nos impostos sobre bens e serviços, mas alivia na taxação sobre o patrimônio. Quem tem um carro velho e desvalorizado paga IPVA, mas quem tem lancha, iate ou helicóptero não paga imposto nenhum.

O sistema brasileiro tenta tributar de modo igual pessoas que estão em condições econômicas diferentes. A tabela do imposto de renda, por exemplo, ficou oito anos congelada e só foi corrigida neste ano pelo presidente Lula. Ainda assim, a isenção ainda é restrita a brasileiros com renda de até dois salários mínimos por mês. Vale lembrar que a tributação no País, ao incidir mais sobre o consumo (imposto direto) do que a renda (imposto direto), é do tipo regressiva: quem ganha mais paga proporcionalmente menos impostos.

Se o projeto de taxação dos super-ricos for aprovado, a Receita passará a cobrar, a cada semestre, imposto de renda dos fundos exclusivos. Além disso, uma vez por ano, taxará bens e aplicações em fundos offshores. De início, o governo Lula esperava arrecadar R$ 20 bilhões em 2024 e até R$ 54 bilhões até 2026. Com as mudanças sofridas pelo projeto, a arrecadação será menor – mas, ainda assim, expressiva.

Nesse sentido, a taxação dos super-ricos é um avanço na luta contra a desigualdade. Devemos pressionar o governo para que ao menos parte dessa arrecadação seja destinada a projetos ligados à distribuição de renda. Uma tributação progressiva, aliada a políticas como a de valorização do salário mínimo, é caminho para buscar mais igualdade no Brasil.


Assis Melo

Presidente da Fitmetal (Federação Interestadual de Metalúrgicos e Metalúrgicas do Brasil) e do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul e Região (RS)