A Fundação Maurício Grabois (FMG) promoveu, em 5 e 6 de junho, o ciclo “Reindustrialização do Brasil e a Estratégia de Desenvolvimento Sustentável e Soberano”. Com foco no debate sobre a Nova Indústria Brasil (NIB), as mesas reuniram nomes como a ministra Luciana Santos (Ciência, Tecnologia e Inovação) e o economista Luiz Gonzaga Belluzzo.
Nesta entrevista, o presidente da FMG e vice-presidente nacional do PCdoB, Walter Sorrentino, faz um balanço de ciclo e detalha aspectos relevantes sobre os rumos da indústria nacional. “O consenso é de que a industrialização é o vetor dominante para a retomada do desenvolvimento do país”, afirma. Leia abaixo a entrevista.
O ciclo da Fundação Maurício Grabois reuniu debatedores ligados ao governo, ao meio acadêmico, à indústria e aos trabalhadores. Existe algum consenso nas visões desses diferentes atores?
Walter Sorrentino: Os participantes convergiram sobre os pontos positivos do Programa da NIB e que a reindustrialização em novas bases tecnológicas é vetor central para a política desenvolvimentista. Não faltaram, nesse sentido, referências ao ciclo histórico e político do Brasil entre 1930 e 1980 e a desindustrialização iniciada no País desde o fim dos anos 1980, com a crise da dívida e, posteriormente, o Plano Real. Isso abrangeu tanto a primeira mesa – personagens da política, da sociedade civil e intelectuais – como a segunda, composta de destacados atores do mundo sindical.
O consenso é o de que a industrialização é o vetor dominante para a retomada do desenvolvimento do País. E isso integra a luta pela constituição de um novo projeto nacional ao Brasil para afirmar com autodeterminação sua soberania, voltada à superação das desigualdades sociais e regionais, para elevar a condição de vida material e espiritual de todos os brasileiros. Enfim, servir à vida das pessoas, pois, como foi ressaltado, não vamos superar as desigualdades sem a reindustrialização.
O que podemos tirar de lições da nossa prolongada desindustrialização?
Sorrentino: Um ponto de partida rico do debate foi exatamente isso, sobretudo no que se refere à política macroeconômica e à inserção do Brasil no mundo. A principal é que o papel do Estado é elemento central e indispensável para a reindustrialização, como indutor e promotor de investimentos em primeira instância, amealhando também investimentos privados, para coordenar e sustentar o projeto. Isso não convive com o tripé macroeconômico do Consenso de Washington, nem com a austeridade fiscal como é pregada por essa hegemonia.
As condições para o programa da NIB estão dadas hoje?
Sorrentino: A experiência acumulada pelos participantes do Ciclo permitiu expor um amplo cardápio dos desafios envolvidos – a começar pelo reconhecimento das medidas positivas e bem direcionadas do governo Lula 3. Entretanto, uma tônica geral e consensual se voltou para a necessidade de mais foco, coordenação institucional e capacidade de realização do governo, seja nas missões proposta no Programa da NIB, seja no contorno institucional e econômico. Nesse sentido, foram consideradas extremamente relevantes e necessárias medidas como a importância da Petrobras, os custos da energia e, em especial, o planejamento como arma indispensável à coordenação e implantação do projeto.
Ao mesmo tempo, foram bem evidenciados óbices e limites existentes. Isso abrangeu proposições sobre transformações institucionais necessárias ao Estado brasileiro para impulsionar a reindustrialização, as questões de política macro e microeconômica, os desafios de superar o hiato tecnológico num mundo conturbado, mormente quanto ao protecionismo dos países mais ricos. Nessa rota, a ciência, tecnologia e inovação representa um polo decisivo para ultrapassar o atual patamar da indústria brasileira. Aliás, registre-se, ninguém demoniza a automação crescente – ao contrário, resguardados direitos e considerado que a indústria hoje está também nos serviços e no agro, exatamente pelas novas tecnologias.
A segunda mesa trouxe o ponto de vista dos trabalhadores. O que sobressai na análise do movimento sindical?
Sorrentino: No concernente aos líderes sindicais, evidentemente compareceram as pautas trabalhistas fundamentais: melhores empregos, contra a precarização do trabalho, redução da jornada sem redução salarial. Interessante notar que em ambas as mesas se registra a crítica à pauta dos setores industriais nos últimos 30 anos, desde o Plano Real, pelo Estado mínimo, tributos mínimos, direitos mínimos. Uma pauta que os levou a serem mais desempoderados ainda politicamente, sob a batuta financeira. Isso levou à desindustrialização e à desnacionalização.
A sociedade brasileira está ganha para um projeto tão estratégico como o da Nova Indústria Brasil?
Sorrentino: A NIB ainda não é um consenso nacional. Uma luta política e social é necessária para fazê-la exitosa. Ela precisa ser mais que uma política de governo, no sentido de se tornar uma política de Estado e, portanto, carece de uma pactuação entre o mundo da produção, o mundo do trabalho e a sociedade brasileira. Sem isso, não há maioria política e social de apoio, indispensável para confrontar forças que sustentam o caminho da dependência e estagnação.
O Ciclo de Debates cumpriu seu objetivo?
Sorrentino: Sim. Nossa Fundação dá uma contribuição nessa luta política, voltada para superar a dispersão política das forças progressistas e ajudar, com apoio e crítica construtiva, a levar a êxito o governo Lula 3. É gratificante ter reunido atores tão importantes da vida nacional – o MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação), a CNI (Confederação Nacional da Indústria), as centrais Sindicais, intelectuais, partidos e movimentos sociais. Unir todos em torno dessa bandeira, comprometidos com um novo projeto nacional, é um passo na direção necessária, conforme o Ciclo evidenciou. Outros mais virão.
André Cintra
Jornalista, é assessor de Comunicação da Fitmetal